Antes de o Brasil parar para acompanhar a votação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, em abril de 2016, o Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas de Acesso à Informação da USP analisou 8.290 reportagens publicadas por 117 jornais, revistas, sites e blogs. A conclusão foi surpreendente: três das cinco notícias mais compartilhadas no Facebook entre a terça-feira e o sábado que antecederam a votação eram falsas, conforme noticiou a BBC Brasil.
As fake news, que ocuparam respectivamente 3º, 4º e 5º lugares no ranking de compartilhamentos, traziam as seguintes manchetes:
- “Polícia Federal quer saber os motivos para Dilma doar R$30 bilhões a Friboi”, do site Pensa Brasil (90.150 compartilhamentos);
- “Presidente do PDT ordena que militância pró-Dilma vá armada no domingo: ‘Atirar para matar'”, do site Diário do Brasil (65.737).
- “Lula deixa Brasília às pressas ao saber de nova fase da Lava-Jato. Seria um mandado de prisão?”, também do Diário do Brasil (58.601).
A pergunta que inquieta é: se são claramente falsas, como as matérias conquistam tanto alcance?
A resposta não é nada complexa: as pessoas estão predispostas a acreditar no conteúdos que elas desejam que sejam verdadeiros. Uma pesquisa realizada pelo PLOS ONE, da Inglaterra, em fevereiro de 2015, constatou que 91,5% das pessoas que curtem páginas com teorias da conspiração não interagem em mais nenhum outro ambiente — somente com essas páginas. É lá que elas fomentam suas convicções com informações convenientes e, por isso, bem-vindas. “Onde rumores infundados se infiltram, boatos podem facilmente proliferar”, completa o estudo.
Vimos isso acontecer no Brasil antes mesmo de o Facebook nascer. Em 1998, após a Seleção Brasileira ser derrotada pela França na final da Copa do Mundo de futebol, um sujeito invadiu o site da CBF e inventou uma história fantasiosa. Ele dizia que os jogadores brasileiros haviam entregado o jogo em troca de patrocínio vitalício da Nike e de o Brasil se tornar país-sede da Copa seguinte, em 2002. Cravou, ainda, que a Copa de 2006 seria no Japão e na Austrália e que os jornais The Wall Street Journal e Gazzeta dello Sport publicariam a denúncia dali a pouco tempo.
No entanto, o grupo de jogadores daquela Copa nunca recebeu o tal patrocínio vitalício, a Copa de 2002 foi na Ásia, a de 2006 na Alemanha e os dois jornais nunca publicaram nem uma linha sequer sobre a tal denúncia. Mesmo assim, muita gente ainda propaga a história. Afinal, ela é conveniente para reforçar suas convicções, como corrupção no futebol, justificativa para a derrota etc.
Em outras palavras, se o leitor estiver predisposto a concordar com uma informação, não importa o quão inverossímil ela seja, ele tende a ignorar os indícios de falsidade e acreditar no que lê. E, então, compartilha. É a partir desse ponto que informações falsas podem perturbar ou mesmo prejudicar uma marca. Por exemplo, numa das matérias falsas que antecederam a votação em Brasília, a Friboi foi citada. É claro que a corrupção frequentemente denunciada somada ao fervor dos debates políticos nas redes sociais propiciou a viralização dessa matéria. O ponto é que, de repente, surgiu uma marca — no caso, a Friboi — sem uma acusação clara da qual se defender.
Desta vez, foi a Friboi, mas poderia ser qualquer outra empresa de grande porte.
Ninguém está salvo dos fakes. Em janeiro de 2013, um usuário criou uma fan page falsa da rede de lojas de móveis Etna. Aproveitando que a empresa havia tirado temporariamente a página real do ar para reformulá-la, o falsário publicou este post:

Os comentários obviamente não foram nada amistosos e obrigaram a equipe de comunicação da empresa a controlar um princípio de crise.
O fenômeno não está restrito ao Brasil. Em dezembro de 2015, circulou nas redes sociais a imagem abaixo, sugerindo que determinados alimentos servidos pelo McDonald’s são feitos de intestino reto de porco desossado em vez de carne bovina. Apesar da montagem malfeita, muita gente compartilhou a foto.

No começo deste ano, voltou à tona um velho boato de 2014 envolvendo a RedBull. Um post publicado no site Topinfo Post e em muitos outros sites indaga: “Você sabia que sua bebida energética contém sêmen e urina de touro?”. A matéria afirma que os dados são da Longhorn Cattle Company, mas é tudo cascata.

Não há fórmula para enfrentar essas situações, mas manter dois conceitos em mente pode ajudar a encarar esse tipo de problema.
- A força da marca conta muito nessas horas turbulentas. Quanto melhor a reputação, menor tende a ser a dificuldade de gerenciar o foco de incêndio ou até uma crise — e vice-versa. Por exemplo, um político figurará mais facilmente como alvo de um boato do que Apple, Google ou Coca-Cola, que ocupam as três primeiras posições no ranking internacional das marcas mais valiosas da Interbrands. Nesse ponto, content marketing pode contribuir para melhorar o brand equity (força da marca), especialmente em grandes empresas.
- O monitoramento e a agilidade na comunicação serão determinantes para agir nos focos de incêndio, caso surja um boato envolvendo a marca. O trabalho de relações públicas e assessoria de comunicação continua tendo peso, especialmente em redes sociais.
O livro Content Marketing Masterclass foi lançado em setembro deste ano e está disponível nas versões impressa e Kindle. São 52 aulas transformadas em 52 capítulos.
Este artigo foi originalmente publicado em janeiro de 2013 e vem sendo constantemente atualizado e enriquecido desde então.