A história do podcast começa em 1993. Foi nesse ano que ocorreu a criação do que pode ser considerado o precursor do podcast. O protagonista dessa história foi um especialista em tecnologia da informação americano chamado Carl Malamud. Foi ele quem lançou o Internet Talk Radio, um programa de entrevistas com profissionais de tecnologia. A pauta sempre girava em torno das potenciais evoluções da internet.
A base tecnológica utilizada naquela época para rodar o programa de entrevistas em áudio era um serviço chamado RCS (Radio Computing Services), fundado nos Estados Unidos nos anos 80. Esse serviço havia revolucionado a indústria de radiodifusão lançando softwares de automação da gestão de programação de estações de rádio, como o RCS Sound e o Selector.
A RCS usava bastante o formato de arquivo MIDI (Musical Instrument Digital Interface), que foi criado em 1983 por um grupo de fabricantes de instrumentos musicais liderados por Dave Smith, então presidente da Sequential Circuits, e Ikutaro Kakehashi, fundador da Roland Corporation.
Os arquivos MIDI estabeleceram um padrão industrial que permitiu que instrumentos musicais eletrônicos, computadores e outros equipamentos se comunicassem entre si para controlar sons e músicas. Mais do que isso, o formato MIDI possibilitou a distribuição digital de arquivos de áudio e eliminou a necessidade das fitas cassete para essa finalidade.
Entretanto, poucas pessoas possuíam habilidade técnica para instalar esses arquivos em um computador pessoal e encontrar uma forma de reproduzi-los. Isso era uma barreira para a difusão do conteúdo do Internet Talk Radio.
Apesar dessas limitações, Malamud já tirava proveito de uma característica até então inédita para o formato de áudio: a capacidade de pausar a reprodução. Essa inovação marcou o início da experiência mais próxima do que hoje conhecemos por podcast, mas ainda operando de maneira offline.
Formatos de áudio
Durante os primeiros anos da década de 90, o software de gravação do Windows era capaz de capturar e reproduzir arquivos de áudio em formato wave (extensão .wav), criado pela Microsoft em 1991. O problema do wave é que ele armazena, mas não comprime o áudio. Resultado: os arquivos tendem a ser grandes, embora tenha a vantagem de manter a qualidade original do som sem perdas.
Isso era um problema enorme naquela época porque os disquetes, usados para transferir arquivo de uma máquina para outra, comportavam apenas 1,44 megabytes. Ou seja, uma gravação de poucos segundos em wave não caberia num disquete. Então, as pessoas até poderiam gerar algum conteúdo de voz, mas o arquivo de áudio dificilmente sairia do computador onde foi criado.
Isso não inibiu a indústria, que foi criando outros formatos de áudio. Por exemplo, o RealAudio foi criado pela RealNetworks em 1995; o WMA (Windows Media Audio) foi lançado pela mesma Microsoft em 1999. Porém, os formatos novos não resolviam o problema antigo. Os arquivos eram grandes demais para caberem em disquetes.
O desenvolvimento de software de áudio avançou na segunda metade dos anos 90, impulsionado pelo rápido crescimento da internet — e pelo aprimoramento dos computadores pessoais. Esses avanços possibilitaram o consumo de áudio digital, com alto-falantes e fones de ouvido se tornando itens comuns nas residências. Os kits multimídia se tornaram acessíveis em termos de custo, inicialmente nos Estados Unidos e posteriormente no Brasil.
Foi nesse contexto que surgiram programas para que as pessoas tivessem mais intimidade com áudio em seus computadores, como o Winamp (de 1997), que possibilitou a reprodução de música digital, e o Napster (1999), introduzindo a revolucionária troca de arquivos de música via P2P (peer-to-peer). O Napster, em especial, ganhou destaque por seu envolvimento em disputas legais com a indústria fonográfica no início do século XXI.
Até o final da década de 90, a internet já havia se firmado como parte integral da vida cotidiana, com o número de usuários globais alcançando meio bilhão — hoje, passa dos 5 bilhões. Embora o streaming ainda fosse uma novidade limitada, o uso de softwares como Winamp e Napster simbolizava o início do fim da era dos dispositivos portáteis de mídia física, transformando radicalmente a maneira como as pessoas acessavam música e informações.
A contribuição do MP3
Todos esses formatos e softwares escreveram a história, mas nenhum deles resolveu o velho problema do tamanho de arquivo, que era crítico naquele início da vida online, em que as pessoas tinham conexão discada — portanto, lenta.
No final dos anos 90, alguns provedores de internet começaram a oferecer conexões ISDN (Integrated Services Digital Network) que podiam atingir velocidades de até 128 Kbps, uma melhoria enorme em relação ao dial-up, mas ainda limitada e cara. Para se ter uma ideia, uma conexão de 100 MBS, comum nos dias de hoje, é cerca de 800 vezes mais rápida do que os 128 Kbps da época.
Seria muito conveniente se alguém conseguisse comprimir os arquivos de áudio sem perder a qualidade — e coube ao MP3 resolver esse problema.
O MP3 foi, na verdade, uma inovação do Fraunhofer Institut, da Alemanha. O formato começou a ser desenvolvido em 1987 e foi patenteado em 1989, sob liderança do pesquisador alemão Karlheinz Brandenburg, considerado o “pai do MP3”. Contudo, foi apenas dez anos depois, em fevereiro de 1999, que a gravadora SubPop começou a distribuir músicas nesse formato. Ela percebeu a grande vantagem do MP3: a capacidade de comprimir arquivos sem perda significativa de qualidade do áudio.
Esse avanço tecnológico permitiu que o MP3 se popularizasse rapidamente, com usuários do Napster, por exemplo, deixando seus computadores ligados durante a noite inteira para baixar faixas de música que tinham aproximadamente 4 MB.
O MyAudio2Go oferecia um serviço similar, embora focado em notícias de esportes, entretenimento, clima e cultura, mas não conseguiu se sustentar — e a i2Go, sua desenvolvedora, faliu após o estouro da bolha da internet pouco mais de um ano após seu lançamento.
RSS entra em cena
Enquanto a indústria corria para desenvolver e aprimorar os formatos de áudio, o conceito de RSS começou a ganhar forma em setembro de 2000, com o lançamento do programa MyAudio2Go pela i2Go. Ele funcionava como um agregador de conteúdo para PCs com as lentíssimas conexões à internet da época.
Em outubro do mesmo ano, a ideia de usar o RSS para a distribuição de conteúdo começou a ganhar força entre pioneiros digitais, como o expert em TI Tristan Louis, o desenvolvedor de software e autor Dave Winer e a figura midiática Adam Curry.
Essa iniciativa começou em outubro de 2003, quando Dave Winer realizou um evento na Universidade de Harvard focado em blogs. Ele distribuiu CDs com arquivos de áudio aos participantes para demonstrar o potencial de crescimento da mídia de áudio digital. Ele precisava dar um nome a isso — e decidiu chamar de “audioblogging”.
Adam Curry aproveitou a oportunidade para publicar um tutorial em seu blog, ensinando como distribuir arquivos MP3 via RSS e sincronizá-los com um iPod, dispositivo da Apple que já se destacava no mercado dois anos após seu lançamento.
Rapidamente, desenvolvedores de software identificaram uma oportunidade de mercado. Com o crescente interesse das pessoas em distribuir e ouvir arquivos MP3 via RSS, especialmente em dispositivos como o próprio iPod, surgiu a demanda por aplicativos que facilitassem funções ligadas a áudio.
O iPodderX foi o primeiro software a ganhar popularidade, mas devido a questões de direitos autorais relacionadas ao nome “iPod”, teve que ser rebatizado para Transistr. O iPodder enfrentou o mesmo problema e foi renomeado para Juice. Outros vieram na esteira, como o CastPodder e o Liberated Syndication (abreviado para Libsyn).
O nome “podcast”
Na ausência de um nome melhor, usava-se o “audioblog”. O termo pegou carona na onda do já popular blog, que tinha surgido em 1994, ganhado o nome de “web log” em 1997 e sido renomeado em 1999 para “blog”. Acontece que “audioblog” não era um nome sexy. Foi daí que pintou a ideia de “podcast”. Já disseram que a Apple cunhou o termo para associá-lo ao iPod, mas não é verdade.
O criador do nome “podcast” foi o jornalista britânico Ben Hammersley. Em busca de uma denominação adequada para esses conteúdos que se assemelhavam a blogs em formato de áudio, Hammersley propôs o termo “podcast” em um artigo para o The Guardian, publicado em 12 de fevereiro de 2004.
O nome “podcast” rapidamente ganhou a adesão de figuras importantes, como Winer e Curry, além de ser amplamente aceito pela comunidade digital daquele momento. Hammersley, inclusive, registrou o domínio podcast.net.
A adoção do termo se consolidou e, em junho de 2005, a Apple integrou oficialmente a palavra ao lançamento da versão 4.9 do iTunes, oferecendo funcionalidades específicas para a edição e reprodução de áudio, como GarageBand e QuickTime Pro. Um indicativo da popularidade do podcast nos Estados Unidos foi a publicação, em junho de 2005, do primeiro livro dedicado ao assunto, “Podcasting: Do-it-yourself Guide“, de Todd Cochrane. Em julho daquele ano, o presidente George W. Bush deu início a um podcast semanal e, em dezembro, o termo “podcast” foi registrado no dicionário Oxford da língua inglesa pela primeira vez.
Outras grandes empresas também se aventuraram cedo no universo dos podcasts. O Yahoo!, principal rival do Google na época, lançou em 2005 um diretório de podcasts, permitindo que os usuários se inscrevessem e baixassem episódios, embora o serviço tenha sido descontinuado em outubro de 2007.
Ainda em 2005, o comediante britânico Ricky Gervais estabeleceu um recorde no Guinness Book por alcançar o maior número de downloads para um único episódio de podcast, com 261.670 downloads. O recorde foi superado por Adam Carolla em 2011, com impressionantes 59.574.843 downloads únicos de 2009 a 2011. Programas de destaque começaram a surgir a partir daí, como o “Later This Week“, de Leo Laporte, lançado em abril de 2005 e ainda ativo.
No Brasil, os primeiros passos no mundo dos podcasts também foram dados nessa época, com o “Digital Minds” lançado em 21 de outubro de 2004, seguido por outros que tiveram mais longevidade, como o “Café Brasil“, que começou como um programa de rádio em 2005, virou podcast em 2006 e continua sendo um dos mais escutados no País até hoje.