O Hype Cycle das tecnologias, hipótese levantada pela consultoria Gartner a partir de 1995 (e que a Tracto adora explicar em sua pesquisa anual) nos ajuda a reconhecer um movimento padrão: boas ideias, traduzidas em ferramentas, começam com entusiasmo, atingem um nível máximo, despencam desacreditadas e atingem um nível de esclarecimento – caso não evaporarem na obsolescência antes de chegar nesse lugar.
Inegavelmente, o uso das mídias sociais por organizações alimentado por potenciais oportunidades de relacionamento com seus públicos, percorre este hype no Brasil desde os primeiros movimentos do Orkut, há pouco mais de dez anos. E afinal, em qual momento da curva estamos hoje? Ao procurar por evidências, a jornalista e pesquisadora Ana Brambilla reúne vozes plurais, que discutem relações entre estas plataformas e o mercado, em seus ebooks Para Entender as Mídias Sociais.
Depois dos primeiros volumes, lançados em 2011 e 2012, o projeto chega a sua trilogia, novamente disponível para download gratuito. Organizada por Ana ao lado de Cristiano Santos, a obra discute as mídias sociais com tom questionador, uma característica da fase descendente da curva. Ela admite que, num primeiro momento, o fascínio era traduzido em uma expectativa de diálogo, que não se realizou.
Vivemos uma década inteira de encantamento com as redes sociais. Elas eram a Ágora Digital, visando a coletividade, o bem de todos. Por outro lado, empresas poderiam se beneficiar desse espaço. O livro representa um desencantamento necessário, para colocarmos o pé no chão. Esse espaço é como a gente esperava ou, por conta de quem é dona das ferramentas, orientado por elas e seus algoritmos, precisa ser ressignificado?
Superficialidade
Um dos incômodos compartilhados por Ana Brambilla está no fato das empresas não prestarem atenção nas oportunidades de uso coerente, otimizado e sustentável dessas redes, levando em consideração o que realmente gera movimento:
Redes sociais, mesmo sendo um espaço pertencente às donas das empresas, é antes de tudo das pessoas. E o que elas postam? É muito mais música, comentários de assuntos pessoais, outros temas que acabam conectando ao outro. O uso que pessoa física e jurídica fazem das redes sociais são completamente diferentes. Por isso a conta não fecha, pois está cada um jogando para um lado.
O uso das redes pelo Jornalismo é um exemplo de apropriação simplificada, ou melhor, preocupada apenas com indicadores quantitativos: tráfego, likes, entre outros números fáceis de serem inflados.
A exploração das mídias sociais pelos veículos é superficial. Jornalismo explora as plataformas naquilo que ela é mais banal: compartilhar links e esperar pelo clique do usuário. Vou medir o engajamento conforme a quantidade de cliques e quantidade de posts. Será que isso é realmente engajamento?
Gestação longa
Para se chegar ao terceiro volume, mantendo sua dinâmica voluntária do início ao fim, os organizadores enfrentaram alguns contratempos: da chamada inicial e seleção dos 26 artigos que compõem a obra, em 2013, até o lançamento quase três anos depois, o trabalho avançou num ritmo inversamente proporcional à vida pessoal dos organizadores. Ana Brambilla ressalta, no entanto, a importância do registro de um período efervescente. Além do fato de algumas questões permanecerem bastante atuais.
Para Entender as Mídias Sociais nasceu a partir da ideia original do historiador Juliano Spyer, durante a Campus Party de 2009, que reuniu vários profissionais de comunicação digital em atividade no mercado para descrever, em textos curtos, os principais conceitos que atravessavam a Internet naquele momento. Editado pela Edições VNI, de Salvador, o trabalho é publicado sob licença Creative Commons, ou seja, autoriza a reprodução e a distribuição do material desde que mencionada a fonte. O projeto gráfico foi criado e executado pelo designer Cássio Aguiar. A capa tem criação do designer Alexandre Zanardo.
Ouça e leia
A entrevista completa com Ana Brambilla, com duração de 19 minutos, está disponível no canal da Tracto no Soundcloud.
Não deixe de ver ainda a evolução das mídias sociais registradas nas três edições de Para Enteder as Mídias Sociais: volume 1 (2011), volume 2 (2012) e volume 3 (2016).∞

Sobre o autor: André Rosa é jornalista, mestre, doutor, pesquisador e professor em cursos livres, de graduação e pós-graduação, sempre procurando promover o encontro entre a comunicação e a tecnologia. Seu blog tem mais de uma década anos de vida.